sexta-feira, 6 de agosto de 2021

O tamboril e a dependência emocional

Nos mares profundos onde a vida é escassa, existe um peixe peculiar, o tamboril. Para copular, ao encontrar a fêmea, ele morde a barriga dela, e o preço dessa escassez é se fundir a ela ao mordê-la. Ele morde e se prende, e após o ato, ele é parte dela, seus vasos sanguíneos se ligam aos dela e eles passam a ser um só durante a vida inteira.


Mas existe um preço a ser pago por essa união tão selvagem, ele deixa de respirar por ele mesmo, ele deixa de ser ele mesmo e agora o seu sangue é o sangue dela, o que o mantém vivo é a fêmea, e ele está ali com apenas um objetivo, cumprir o papel de conceder o esperma para a reprodução quando a natureza julgar necessário acontecer. Ele deixa de ser importante para si e se torna importante apenas para o papel do outro, abandona tudo por apenas um propósito de vida, pertencer a alguém e proporcionar assim a manutenção da sua espécie.


Há algo de positivo em ser o escolhido, pois naquela região do mar há pouca vida, então uma oportunidade como essa precisa ser aproveitada se você for um tamboril e não quiser passar o resto da sua vida vagando pela escuridão e não ter sua espécie extinta por ficar escolhendo demais. 


Conosco não nos parece diferente, muitas pessoas agem como o tamboril, se agarram de tal forma ao parceiro, que é como se abandonasse a própria identidade para viver a vida do outro. Mudam de time, deixam de lado seus gostos pessoais, perdem as amizades, a vida inteira é abandonada em troca de uma união que é quase parasitária. Eu me prendo a ti, você me alimenta, me sustenta, me dá tudo que eu preciso para viver, eu me torno sua extensão e te dou tudo que você precisa para continuar vivendo sua vida. Assim são alguns relacionamentos abusivos, assim é quando ambos não percebem a gravidade da situação que é abrir mão de si mesmo para viver exclusivamente para alguém, como se não houvesse outro propósito de vida. Abandonar tudo, ter áreas da vida completamente desfuncionais porque o outro vai te suprir.


Quantas relações atualmente sobrevivem assim? Muitas! A pessoa abre mão de sua identidade para ser apenas extensão do outro ser e só não sai dessa vida parasitária porque tem medo de viver o novo, já não se conhece mais a si mesmo, já não sabe o que seria se estivesse só, o que resta é abandonar as próprias nadadeiras e deixar que o digam onde ir.



Não ser como um tamboril é um ato de coragem, que exige da pessoa autoconhecimento suficiente para compreender que relações humanas não devem ser parasitárias, cada um oferece o que tem, e se não tem nada para oferecer, você só deve permanecer se gostar e se houver entendimento suficiente para se compreende que ambos estão livres para ser quem são. O casamento é uma espécie de fusão, duas pessoas que se tornam uma só carne, com objetivos, sonhos, caminhos que são realizados em parceria, ninguém se anula, ninguém se desfaz, ambos se completam. Em relações onde um dos dois é um tamboril, a carroça tomba, ninguém segue em frente porque não são dois em busca das realizações, é um só, porque o outro se realizou no exato momento que descobriu alguém que comporte a sua ausência de sentido, é o chamado jugo desigual, citado na bíblia.


Quem você é quando está só? Um tamboril em busca de sentido na vida? Está apenas cumprindo seu papel de manutenção da espécie? Espero que não! A vida é muito mais que buscar um lugar comum que seja confortável. Primeiramente, como diz o filósofo, "Conheça-te a ti mesmo". Pensem bem que tipo de relação vocês querem viver, uma relação na escuridão profunda do mar, onde eu tenho medo de ficar só, ou uma relação na luz, onde eu sei quem eu sou e desejo alguém que me dê a mão sem abrir mão da individualidade e principalmente da identidade para continuarmos a caminhada.


Na dúvida segue a luz!


Pedro Garrido

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