quinta-feira, 16 de janeiro de 2020

Sonho e memória

Nada é tão nosso quanto o nosso sonho, já dizia o filósofo existencialista.

Estranho um existencialista dizer que algo tão profundo quanto nossos sonhos serem nossos, visto que ao que parece, somos um nada no meio de um vasto universo sem destino. O que eu quero dizer com isso é que até o mais desacreditado filósofo, poeta ou estudioso da matéria humana, tem esperanças de quem mesmo sendo poeira cósmica, ainda temos algo que é nosso.

É como dizem sobre a memória, que existimos até o momento que a última pessoa viva na terra tenha uma última lembrança sobre nós, mesmo que seja uma lembrança mórbida, bem distante, ainda existimos se na mente de alguém estamos vivos. Somos nossos e somos uns dos outros, somos individuais e somos do coletivo, não existimos se não sairmos da caverna de Platão, dentro da caverna somos só ideias, sombras de algo que na luz é a realidade.

Mas voltando a questão do sonho, o que é o sonho senão um conjunto de idealismos baseados em nossas experiências e conquistas vividas em algum bom momento? Se não somos nada além de poeira cósmica por que, ao contrário dos outros animais temos idealismo tão fortes com relação ao nosso próprio eu? Se sonhamos é porque alguém sonhou primeiro, acredito eu... É como se alguém tivesse dito a primeira palavra no mundo pela primeira vez e outra pessoa também quisesse dizer essa palavra, só que a partir dessa primeira palavra, descobrimos outras e formamos frases, até que exista um conjunto completo de textos e números. Parece, ao meu ver, que sonhar é isso, tomar experiências de outras pessoas e aprender, aumentar, dar novos rumos, formar um alfabeto inteiro de novas possibilidades.

Nosso sonho é nosso, mas já pode ter sido o sonho de alguém, pode vir a ser o sonho de um filho, o sonho de um pai, então memórias e sonhos parecem que permeando a história da existência é o que nos mantém vivos antes e depois do inevitável fim.

Até o mais existencialista quer se manter vivo por mais que a própria existência se resuma a ser um amontoado de células e átomos vagando a esmo em um universo sem propósito. Meu sonho é de que no fim do caminho, mesmo que um dia meus átomos não pertençam mais a mim, meus sonhos não morram na memória de uma outra pessoa, eu sonho com um fim que se faz em eternidade, onde tudo que vivemos faz total sentido, diante da incredulidade de quem morreu em vida por causa do alfabeto que não soube criar.

Nada é tão nosso quanto nossos sonhos, espero que nós nunca possamos deixar de sonhar.

Pedro Garrido

quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

Sobre click e Norbit

Não sei se vocês já repararam, mas alguns filmes de comédia não são comédia de verdade. 

Sobre Click e Norbit:

Click é um exemplo de filme que nos faz refletir sobre a ansiedade, apesar das risadas que nós acabamos dando, muitos de nós temos a mesma vontade de acelerar o tempo, parar em uma memória, rever a vida em modo filme e diversas outras coisas. Click nos mostra as maldades que cometeríamos se fôssemos egoístas a ponto de manipular a história ao nosso favor, a história da nossa vida seria anulada para vivermos as pressões que os outros nos colocam e para que cumprissemos as metas preestabelecidas de uma sociedade que busca o sucesso a qualquer custo, em troca de um prazer de curto prazo que no fim resulta em morte.

O personagem principal até consegue dinheiro, sucesso na carreira, uma casa, mas com que preço? Ele perde a presença dos filhos, esposa, o prazer, os momentos de lazer, ganha e perde peso radicalmente, quase enlouquece e se não fosse o final mágico em que ele recebe uma segunda oportunidade, ele teria jogado tudo água abaixo.

Já Norbit, teoricamente é para ser um filme engraçado sobre um cara que teve o azar de casar com uma mulher gorda e mandona, mas na verdade retrata uma coisa que passa muito despercebida por nós, o relacionamento abusivo. Um cara que foi abandonado ao nascer, o dono ao vê-lo já diz que ele era feio, viveu em um orfanato e sofria bullying dos colegas, e entre um abuso e outro, uma colega o defende das agressões destes garotos e o ordena como namorado, o tempo passa, ele é coagido pelos 3 irmãos dela a se manter fiel e sem força nenhuma para terminar a relação, ele se casa. Entre todos esses momentos ruins da infância, um único bom momento é retratado, quando ele é uma coleguinha de infância se casam de brincadeira e após ela se mudar, eles perdem o contato.

O pior está por vir quando depois de anos de casado, ele descobre uma traição da esposa e ela simplesmente tenta inventar uma história qualquer, fingir que não tinha acontecido nada ou jogar a culpa para ele e não há para onde fugir, até que sua antiga paixão de infância reaparece.

Ela aparece noiva de um cara abusivo que quer se casar com ela apenas por interesse, e por interesse ele e os irmãos da Rasputia, se unem para um objetivo maior, vender o orfanato antigo para fins obscuros.

Entre vários abusos de diversos lados, ele se reencontra com esse antigo amor, revive as inocência da infância e vê nela a esperança de sair desse mundo mórbido que era a vida dele, e após ameaças de morte realizadas ela esposa ele se vê obrigado a desistir do seu sonho.

Como todo filme que se preze, tem que haver um momento de superação e tudo se resolve quase milagrosamente no final e todo mundo que o assiste ri como se nada tivesse acontecido, mas pense bem:

Não é esse tipo de relacionamento que muitos vivem o tempo todo? O que faz de Norbit um filme engraçado? Na minha opinião o filme é de doer o coração, porque muitos vivem relações assim e não possuem coragem de contar, sobrevivem de migalhas até o fim da vida e se sujeitam a mandos e desmandos por causa da comodidade que aquela vida pode trazer ou por medo de ficarem sozinhos. 

Para mim, Norbit é um filme de dramático, tão doloroso de se ver que eu consideraria trágico, um filme de terror por causa do terror psicológico que os personagens centrais acabam causando um no outro e na sequência de abusos nos variados tipos de relações.

Click ainda traz uma boa reflexão, mas Norbit é um filme que deveria nos fazer chorar, nos condoer com a dor de um abuso emocional recorrente e de uma vida de experiências desastrosamente dolorosas.

- Pedro Garrido

domingo, 12 de janeiro de 2020

Mãos dadas

Ando sozinho pelas ruas onde antes andava de mãos dadas. Não reclamo disso, não é carência, solidão ou essas fraquezas que dizem ser vergonhosas, não é tristeza, memória vã ou sentimentos alcoólicos de um poeta trôpego, não é nada disso. Ando sozinho, porque sei que tudo é momento. Houve um momento em que precisava me segurar nas mãos de alguém, não porque minha estima fosse diminuta, mas porque qualquer um sabe que uma criança quando se livra das mãos dos pais é para correr sem destino definido.

Hoje eu sinto a mesma vontade, de largar as mãos do destino, correr em desatino, quem sabe poder voar, não rumo ao sol, com penas de cera e cair em qualquer lugar, eu quero me jogar de cabeça nas alturas dos planos que Deus tem reservado a mim. Mas cada dia reserva o seu devido momento, preciso ser paciente, perseverante e resiliente, entender que mãos vazias não significa solidão, passos no chão nunca são em vão, nada na vida é vazio de intenção, existe uma forma de retorno para cada ação.

Sim, mesmo que diga não, quem nunca se sentiu só? Hasteio a bandeira da minha verdade, apesar de saber que não estou só, muitas vezes o silêncio na caminhada me faz sentir saudade. Saudade de coisas que talvez nunca tenha vivido, saudade dos sonhos que ainda vou sonhar, saudades da poesia que ainda vou criar, saudades de viver uma vida ímpar! Tomar café da manhã com alguém especial, conhecer outros estados em estado de graça sorrindo para minha amada, ver crianças minhas largando a minha mão e correndo rumo ao mar, para brincar de castelos de areia que na mente delas nunca vão desabar.

Eu quero mais do que falar ao vento, eu quero falar ao mundo, eu quero mesmo tímido, ter o livro mais vendido de todos os tempos, eu quero entrevistas, quero ser visto em rede internacional, numa simples mesa no quintal, ter grandes lições para propagar. Ser lembrado como o velho/jovem/infante que mudou o mundo, se não conseguiu mudar por completo, pelo menos mudou o próprio mundo, quando ousou sonhar pela primeira vez. O garoto que tinha medo de pisar na areia do mar e não largava das mãos de quem quer que fosse pelo medo de nadar, agora mergulha tranquilo pois sabe onde quer chegar.

Ando de mãos dadas com Deus, eu sei que ele ouve minhas orações, faz deste texto uma delas e não me deixa desistir de amar, porque deixar de amar seria largar da mão suprema e correr pra longe de mim. Tão infantil quanto o medo do escuro, é ter medo da luz, por achar que um dia ela pode se apagar.

sábado, 11 de janeiro de 2020

Sentido

Já se perguntou sobre o sentido de tudo? Não o sentido da vida, o universo e tudo mais, mas o sentido das coisas cotidianas, como caminhar na beira da praia, tirar foto do sol no horizonte, falar de amor para conhecidos e desconhecidos, o sentido da ida e da volta, o sentido que transmuta os nossos sentidos...?

Qual é o sentido de fazer o que fazemos? Às vezes parece que nada faz sentido, eu olho para tudo isso é penso: É isso mesmo que eu estou fazendo? O que eu faço é um meio ou uma finalidade? Uma causa ou consequência? É efêmero ou duradouro? Leva a algum lugar ou se encerra ao final do aplauso?

Parece que muitas coisas não fazem sentido nessa vida, coisas que nem uma conversa Socrática dá solução, parece que tudo se encaminha para um final fatal, ou que somos carregados por uma força misteriosa que nos leva a um lugar que com meros olhos humanos não conseguimos enxergar...

Qual o sentido desse texto? Qual o sentido desse pergunta? Qual o sentido de questionar o que estamos fazendo? Pra que tanto esforço pra ter uma resposta? Porque não sorrimos e simplesmente agradecemos pela oportunidade de fazer de bom grado o que fazemos sem nos importarmos se vai ser a última vez?

Tudo que eu quero é que não seja a última vez que amo, a última vez que escrevo, a última vez que sonho, a última vez que eu ouso sonhar com um futuro brilhante, a última vez que dou a mão a alguém fascinante. Mesmo que eu não saiba o sentido de tudo isso. Quero não me deixar levar pelo medo ou ansiedade, quero curtir cada minuto, cada beijo, cada aplauso, cada abraço, cada pingo de chuva, cada devaneio sincero em busca de ser o melhor de mim.

Quero gritar aos 4 cantos o poder do amor, quero não temer o que há de vir após uma curva no rumo da vida, quero ter a surpresa de em um dia qualquer  viver um momento qualquer que tenha um significado qualquer é que tudo neste dia seja gratificante e de satisfação constante.

Eu só queria um farol no meu caminho, uma luz no meio das ondas, uma certeza no mar de aflições que não me faça perder os sentidos quando ver que tudo ao meu redor parece sonho e que estou prestes a acordar.

domingo, 5 de janeiro de 2020

A criança, o mar e os barcos

Quantas são as realidades nesta foto? Quais são as bandeiras que podem ser levantadas? Muitas vezes as fotos são apenas fotos, as pessoas são apenas pessoas, os barcos são apenas barcos, mas criamos dentro disso tudo uma narrativa que talvez não tenha nada a ver com a realidade e a vida dos personagens em questão. 

A realidade nos choca, mas não estamos preocupados com a realidade, estamos preocupados com as aparências, os julgamentos, as análises históricas e esquecemos que a criança talvez só queira brincar e observar os barcos, barcos estes que são fonte de renda para uma população local, e que este local não é só essa criança, mas sim toda a família que está próxima, seja trabalhando, seja se divertindo.

Às vezes a imagem só quer transmitir a beleza, a crítica vem da experiência de cada um... Temos muito pelo que lutar sim, não discordo das bandeiras que são levantadas atualmente, mas que não esqueçamos que a criança nesta foto pode ser eu e você, olhando os barcos e pensando na grandeza por trás das águas, das nuvens e sonhando inocentemente com o céu de algodão doce daqueles que os vendedores passam oferecendo aos frequentadores dos bares e restaurantes que se instalaram.

A criança, o mar e os barcos somos nós.